22 de mai. de 2009

Coluna



até morrer eu sou



Fernanda Pompeu

Crianças são sensíveis a verdades e mentiras proferidas pela família, escola, vizinhança, mídia. Eu cresci ouvindo que o Maracanã era o maior estádio do mundo e o Flamengo, dono da mais numerosa torcida do país.
Carioca da gema, vivi os privilégios de frequentar o maior estádio e pertencer a mais numerosa torcida. Daí, houve domingos em que, pelas mãos do meu pai ou do meu tio, assisti à autêntica missa pagã.
Escrevo missa, porque o Maracanã era um templo. Os torcedores, devotos. As bandeiras, imagens de santos. Os jogadores, sacerdotes. O juiz, bispo. O gol, epifania.
Devoção que se maculou na final do campeonato carioca de 1966. O Flamengo, rico, da zona sul, enfrentou o Bangu, pobre, do subúrbio. Ocimar, Aladim e Paulo Borges, sacerdotes banguenses, fizeram os três gols da partida que nem terminou. Teve briga no campo e na arquibancada.
O bispo apitou o encerramento. Os cem mil rubro-negros, fúnebres, abaixaram as bandeiras. Eu não. Queria porque queria deixar o estádio agitando-a. Meu pai advertiu enrola a bandeia, nós perdemos.
Bati o pé. Saí do Maracanã ostentando o pavilhão ao vento. Com onze anos, compreendia a derrota, mas não assinava a rendição.

2 comentários:

Anônimo disse...

Fernanda,

Você só esqueceu de contar que apesar de magrinha você segurava os vedendores ambulantes , que circulavam pelas arquibancadas, para não atrapalharem a sua visão do jogo.
Que força, que fervor!
Beijos, Cláudia.

Fernanda Pompeu disse...

Não esqueci de contar. É que quando a gente conta, a gente nunca conta tudo. Essa é a graça. O "não dito" está para a prosa, como o silêncio está para a música. Grande beijo.