Paul Singer
Folha de S.Paulo 17/02/09
DESDE� a inesquecível Crise de
1929, a presente é a primeira a
ser combatida com políticas
retiradas do arsenal teórico keynesia
no. Em 1929, quando o estouro da
Bolsa de Wall Street deu início à mais
longa e arrasadora crise da história do
capitalismo, era consenso que os go
vernos deveriam manter austeras
suas políticas monetária e fiscal, por
temor duma possível inflação, induzi
da pela recuperação do consumo e da
inversão. O que houve, porém foi uma
deflação infindável que perpetuou a
retração da demanda efetiva, o de
semprego em massa e o empobreci
mento da maioria da população.
Diante do desastre, alguns gover
nos (dos quais o brasileiro e o sueco
foram dos primeirtos) jogaram o con
senso conservador fora e passaram a
usar o crédito e o orçamento público
para fomentar diretamente o consu
mo, a inversão e a substituição de im
portações, tendo em vista incremen
tar a qualquer custo a atividade eco
nômica nacional. Estas políticas, mo
vidas pela coragem do desespero, lo
graram fazer com que o mundo emer
gisse duma crise que parecia não ter
fim. Diversos economistas de peso
aprovaram então a nova heterodoxia,
entre os quais John Maynard Keynes,
que depois elaborou uma teoria geral
para demonstrar que as políticas he
terodoxas eram racionais tanto para
remediar crises financeiras já estou
radas como para preveni-las.
Nas quatro décadas seguintes, o ar
senal keynesiano de políticas anti-cí
clicas foi amplamente aplicado para
impedir que novas crises financeiras
de âmbito mundial pudessem aconte
cer. Contribuíram para tanto as insti
tuições criadas na Conferência de
Bretton Woods em 1944, não por aca
so presidida por Keynes. O estatuto
do Fundo Monetário Internacional o
proibia de socorrer países cujos go
vernos deixam de controlar a movi
mentação internacional de capitais e
instaurava a estabilidade cambial,
proibindo que o valor das moedas na
cionais flutuasse ao sabor da especu
lação.
Portanto, durante os 40 anos se
guintes, as políticas anticíclicas key
nesianas não tiveram emprego. No
fim dos 1970, no entanto, a onda neo-
liberal começou a desmontar os con
troles multilaterais e nacionais da es
peculação, liberando-a no plano
mundial. Como seria de se esperar, as
crises financeiras voltaram, com o re
torno do consenso de que se os gover
nos se dedicarem ao equilíbrio fiscal,
as crises financeiras seriam passagei
ras. Mas, isso não se aplicava aos Es
tados Unidos, cujo banco central tem
como missão tanto combater a infla
ção como manter a economia nacio
nal em pleno emprego. O Federal Re
serve, manipulava a taxa oficial de ju
ros, elevando-a para forçar o estouro
de bolhas ’excessivas’ e a reduzindo
em seguida para apressar a recupera
ção da economia e minimizar os efei
tos da crise.
Desta forma, um certo keynesianis
mo inconfessado era praticado pela
superpotência capitalista. Agora, com
o estouro de bolhas imobiliárias surge
uma crise tão forte que abala as mais
importantes companhias financeiras
do 1º Mundo e destrói trilhões de dó
lares de capitais fictícios acumulados
nas Bolsas de Valores. Os principais
governos logo reconhecem que esta
crise não pode mais ser contida ape
nas pela redução das taxas oficiais de
juros (hoje quase zero) e apelam para
o arsenal keynesiano de políticas de
fomento do consumo, do investimen
to e do emprego.
Até agora, os pacotes de estímulo
dos governos não têm conseguido im
pedir que a crise encolha o crédito e
comprima a demanda efetiva, o que
resulta em queda quase universal da
atividade econômica e aumento do
desemprego. Isso confirma o pessi
mismo dos bancos, que racionam o
crédito e o encarecem, das empresas
que adiam inversões, reduzem a pro
dução e demitem trabalhadores e dos
consumidores, que restringem seus
gastos, assustados com a ameaça do
desemprego.
A julgar pela única experiência his
tórica disponível, a da Crise de 1929, o
instrumental keynesiano funciona
desde que os governos o empreguem
com rapidez e intensidade para rever
ter as expectativas dos agentes econô
micos. O pânico, que se apossou das
finanças, contaminou a mídia e a opi
nião pública e até o momento não ce
deu perante as ações de fomento
anunciadas pelos governos. Estas só
podem alcançar seus objetivos se fo
rem imitados pelos detentores de
meios próprios para consumir mais
do que o essencial e para investir o di
nheiro não gasto na ampliação da ca
pacidade de produção.
Há políticas disponíveis para abre
viar a presente e prevenir futuras cri
ses. Quais são elas, porém, é tema pa
ra um outro artigo.
18 de fev. de 2009
A CRISE DE 2008: A RESSUREIÇAO DO
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