28 de set. de 2009

lamento






Fernanda Pompeu


Se fosse possível voltar trinta e dois anos, creio que cursaria a Escola Politécnica. Seria engenheira civil. Construiria pontes conectando espaços físicos, palpáveis. Calcularia o valor exato do concreto armado e das vigas de ferro.
Não. Pensando melhor, teria aberto uma loja. Meu trabalho seria contas a pagar, contas a receber, controle de estoque, promoção de vendas. De quebra, estabeleceria uma relação – liquidação a liquidação, gesto no gesto – com a clientela.
No entanto, quis ganhar o brioche de cada dia escrevendo. Projeto extenuante: procurar palavras no recôncavo da língua, ligar uma frase a outra, tecer sentidos mesmo quando o novelo é pequeno.
Virei uma pena de aluguel.
São décadas esquadrinhando ideias para melhorá-las no papel. Fazendo entrevistas para editá-las com elegância. Lendo textos imensos para transformá-los em parágrafos enxutos. Fugindo do lugar-comum como o camelô do fiscal.
O maluco é que acabei gostando. Primeiro, por amor. Depois, por amor também. Passei a ouvir os clientes e mentalmente editar seus desejos. Compreender as necessidades e imediatamente arranjar os conectores que dão coerência e coesão à argumentação.
Enfim, uma redatora. Aquela que redige por encomenda, morrendo de inveja dos escritores – aqueles que escrevem o que lhes dá na telha.
Tenho recompensas: conheço pencas de pessoas interessantes, viajo para lugares instigantes. Mas não sobraram palavras para escrever o romance dos sonhos.

Um comentário:

Anônimo disse...

Gosto muito dos textos da Fernada.De tão precisos acabam ficando delicados!