22 de mar. de 2011

Do conforto ao transtorno


Hector Plasman*
da redação

Apontado pelo administradores públicos como causa das enchentes na cidade de São Paulo, sofás e poltronas devem ter suas vendas controladas

Pelo menos garrafa PET fica na superfície da água, já sofá e poltrona não. Aí está o problema”, afirma Humberto Nurako, coordenador do centro de drenagem da Sabesp. Não é só para os técnicos que sofás e poltronas são os grandes empecilhos para a livre circulação da água na temporada de chuva.

Políticos como o prefeito paulistano Gilberto Kassab também pensam assim e já agem para acabar com essa praga moderna. Além de gastar milhões em limpeza de córregos, desde o ano passado veicula propagandas para que pessoas não descartem objetos nos córregos.

Sem legislação

O descarte de móveis não é regulado nem previsto em nenhuma legislação. É uma grande falha da recente lei que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, aprovada em 2010, afirma o gestor ambiental Nestor Abramnovich, “a nova lei prevê descarte para qualquer resíduos oriundo de atividade humana, desde uma agulha até um membro amputado, mas para móveis, nada. É um absurdo”.

Esse vácuo legal está prestes a ser preenchido com medidas como o projeto de lei 23/2010 apresentado pelo deputado paulista Romiro Bastos (PSDB) que regula o comércio e descarte de “sofás e congêneres”.

Segundo o projeto, a compra de um sofá deverá ser feita com apresentação de um documento do comprador e posteriormente a identificação será gravada na estrutura do imóvel, “eu sei que é uma medida drástica, que vai criar burocracia, aumentar o 'custo Brasil', mas devemos ter instrumentos para responsabilizar o cidadão causador de enchentes”, analisa o deputado.

Com a identificação será possível retirar um sofá causador de enchente e acionar o proprietário. O projeto prevê multas que vão de um salário mínimo até R$ 20 mil em caso de reincidência. Além disso, o consumidor será responsável pelo descarte correto do móvel. Para Abramnovich o princípio do 'poluidor pagador' está sendo cumprido.

Para Ednei Nassib, presidente da Associação Brasileira de Estofadores, a medida encarecerá o custo de produção porque “teremos que entregar os móveis somente após a venda, para que possamos colocar as 'chapas'. E a quantidade de viagens serão maiores, vão depender da demanda.

Um Detran de sofás

Medida mais radical vai apresentar o deputado recém-eleito Natalício Antunes (DEM). Para ele os sofás devem passar periodicamente por vistorias, assim como passam os carros nos Detrans, “imagine em São Paulo são 6 milhões de veículos, qual seria a quantidade de sofás e poltronas passíveis de entupirem um bueiro, 30, 40 milhões?”. “É uma bomba relógio em que nos sentamos diariamente”, conclui o deputado.

Onde Natalício Antunes vê perigo, o presidente da Associação dos Tapeceiros, Adolfo Zingarelli, vê oportunidade de negócios. Segundo ele, a obrigação de identificação e vistoria aumentará o trabalho dos tapeceiros na cidade. Além disso, trará um benefício aos consumidores “se um sofá dura 15 anos, com manutenção periódica chegará a 25 anos Enfim, o consumidor perde no começo com a burocracia mas ganha na vida útil do móvel”.

Questionado se a obrigação de identificação não criaria um mercado paralelo com troca de chapas e estruturas, tanto os deputados como o tapeceiro concordam que isso é possível. Zingarelli aponta o surgimento de locais de desova de sofás e aumento de roubos, pois "o dono de uma velha poltrona pode pegar a do seu vizinho que está nova e fazer um dublê, basta trocar a placa de identificação". Mas o objetivo agora “é acabar com essa praga que devasta São Paulo”, brada o deputado Bastos e conclui “ou é isso ou vamos jogar dinheiro público ad infinitum sem resolver o foco do problema das enchentes”.

*Reportagem especial para a seção "Se assim continuar, assim vai ficar"

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